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quinta-feira, 1 de abril de 2010

Pedaços perdidos



Aos meus três anos de idade, deram-me um livro.

A capa era dura, com um desenho tão abstracto, que me continua a parecer um homem, matando violentamente uma mulher, com uma espada afiada, presa por uma empunhadura vermelha, que ou sendo a sua cor natural, ou sendo o sangue que está sendo derramado, me aterroriza o coração que parece me tentar desviar o olhar.
As páginas estão ainda intactas, e definem a sua suavidade ao tocar a tão suave e pálida pele.
A minha mãe, encontrou este livro no meu quarto, ao lado de meu braço, num dia chuvoso e gélido. Ainda hoje me diz, que se mostrou bastante indignada com aquela mesma situação, pois eu estava calma e dormia que nem um anjo o que a admira bastante pois diz nunca me ter visto assim, pois era irrequieta e “mexiquenta”, mesmo ao dormir.
Não sabe quem o deixou, muito menos com que objectivo. Sabe apenas que era destinado a mim, pois diz na primeira folha, um pouco manchada com uns quantos pingos de chuva:
"-O livro é teu minha criança mais linda, que me deste um sorriso tão verdadeiro quando cheguei perto de ti. Desde o primeiro dia em que te vi passar na rua, vi nos teus olhos que eras tu, eras tu a pessoa mais certa para guardar este livro com a tua própria vida.
 E agora peço a quem encontrou este tesouro valioso, para que o guarde numa gaveta fechada, e que não lhe abra nem mais uma página, para que o seu grandioso segedo não seja revelado a NINGUÉM.
Oh minha querida menina, cuida dele que nem um filho.
Tu és tão especial, que não merecem que te digam que és igual."
E então por baixo deixou uma assinatura, tremida e mal feita, talvez com o intuito de que ninguém a desvendasse.
A minha mãe fez o que devia ter feito. Deitou o livro por baixo da minha roupa de Verão, e á medida que as estações iam mudando, ela mudava o livro para aquela que estava mais longe de chegar, para que fosse menos provável ainda que ele fosse encontrado.
E os anos passaram...
Essa pessoa já passou milhões de vezes na minha mente, e no que depender de mim, continuará passando. Imagino-a como uma mulher que sofreu por amor.
Com os traços mal definidos, e as peles bem enrugadas, pois quem me deixou este mesmo, deveria ser com certeza alguém tão sábio quanto os escritores mais conceituados do mundo.
No retrato que lhe faço tem uns lábios carnudos, pintados de vermelho, pois esta mesma cor significa paixão, sentimento, mas também violência ou agressividade.
Os seus olhos devem ser redondos e castanhos, pois indicam que é, ou foi alguém resistente.
E não tenho mais meios para que caracterizar esta pessoa, pois a minha imaginação também tem limites, como toda as outras.
Deixou também um perfume espalhado na primeira página, penso eu, que rapidamente se espalhou com uma menor intensidade por todas as outras 452 páginas que o livro contém.
Mas, ao ver e reler todo o livro, mais uma vez com uma lágrima que me tenta assaltar a face, reparo que lhe falta uma página.
Uma página arrancada á força, de uma forma repentina apesar de não ser de uma maneira absolutamente irreverente.
Pelos meus treze anos, que foi a primeira vez em que li aquele livro completo, sem uma única marca silábica entre o princípio e o fim, tive um entusiasmo tão enfurecido, que nem eu mesma conhecia em mim.
Não consegui parar, a saliva nem sequer se produzia. O coração nem sequer batia a um ritmo seguro e constante, pois ao chegar a uma parte mais marcante, eu reduzia a respiração e arregalava intensamente os olhos, sentindo o perigo, como quem «entra» num filme quando está no cinema.
Já procurei por todo o mundo, um livro igual a este com o mesmo nome, a mesma imagem que me está sempre presente a todo o minuto.
Não há nada igual, pois de igual, só a resposta: "-Desculpe, aqui não existe nenhum livro com esse nome, talvez esteja enganada, certifique-se do título e volte mais tarde."

 E me lançam um sorriso, como se eu não fosse completamente lúcida.
O resumo deste livro, baseia-se numa palavra que não vou dizer, nem sequer caracterizar, pois o segredo mantêm-se.
O livro é drama/romance, mais especificamente, baseia-se na maioria das frases em um drama de uma vida intensificada pelo amor.
O último capítulo do livro é que guarda o segredo de que a pessoa falava.
 É uma conclusão da vida mais certa qu acertada. Talvez me tivessem deixado este livro pois saberiam que eu seria capaz de compreender o segredo.
Talvez se perguntem: Então mas, se o livro tem o segredo tão pormenorizado, que só tu és capaz de o decifrar, porque tens de ser a única pessoa a poder abri-lo ?
-Porque na mente do mundo tudo é igual ao fútil, tudo é levado para o lado que mais convém, e aquilo que eu penso não é o que o mundo pensa.
Porque sei avaliar as coisas, de uma perspectiva diferente, a que os humanos que vejo, nunca serão capazes.
E a partir do momento em que dizem ser igual ao mundo não sou mais eu, será alguém por mim.
O Conhecimento só é avaliado com conhecimento. E sem conhecimento, ninguém o consegue avaliar.

-E estas são as palavras que faço com os gestos da minha boca, que não se querem definir, aquelas que já não deixo para tráz.-


Somos apenas um pedaço de vida, num pedaço de voz, por um pedaço de nada.


-Arranquei uma folha tão bela, amarela, desta árvore tão pequena, a crescer, desculpa-me pai.
Será que me podes voltar a coloca-la de onde a tirei ?!
Esta imagem pode estar sujeita a direitos de autor.

-Não, porque nem tudo o que se tira se pode voltar a dar da mesma maneira.

4 comentários:

  1. Estive completamente vidrada a ler isto.
    E adorei as frases finais.
    Muito fixe o texto :)
    Bjs

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  2. Escreves muito bem!
    pArAbEns!! ConTiNUa aSSim

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  3. ESCREVES MUITO BEM!! INSPIRASTE EM QUEM??
    OS TEUS TEXTOS SÃO MARAVILHOSOS
    CONTINUA ASSIM
    BEIJINHOS

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Obrigada pela visita